O animal morreu, e agora? A importância da necropsia para o proprietário e para o médico veterinário
9 de abril de 2015 – Atualizado em 09/04/2015 – 12:00am
A morte de um animal de companhia é, para muitos proprietários, como a perda de um ente querido. Neste momento sensível, a opção de realização de uma necropsia pode muitas vezes não ser abordada ou então ser imediatamente descartada, por ser um exame que “não trará o animal de volta” ou porque “o animal já sofreu demais”. Porém, a necropsia tem extrema importância na determinação da real causa de morte do animal e pode, em muitos casos, ser a única maneira de se fechar o diagnóstico de forma precisa.
O exame necroscópico traz informações importantes tanto para o proprietário do animal quanto para o médico veterinário clínico ou cirurgião responsável pelo caso, as quais serão abordadas neste artigo.
O que é a necropsia?
A necropsia é um exame realizado no cadáver de um animal ou de um ser humano, que envolve a avaliação completa e sistemática dos órgãos, tecidos e cavidades, tendo como objetivo principal a determinação da causa de morte¹. O exame do cadáver é feito seguindo-se técnicas consagradas, permitindo a detecção e análise de doenças infecciosas, processos degenerativos, formações neoplásicas, condições congênitas, traumas, dentre outros. A necropsia também permite a coleta de amostras para exames complementares, como histopatológico ou toxicológico, dentre outros. Após a realização da necropsia, o cadáver pode ser reconstituído para devolução ao proprietário para cremação ou enterro, ou então encaminhado para a prefeitura para incineração.
Por que fazer a necropsia: benefícios para o proprietário
A determinação precisa da real causa de morte de um animal pode auxiliar, muitas vezes, no fechamento de um ciclo de luto para o proprietário. Em determinados casos, ao saber com certeza do que seu animal morreu, e que não havia mais nada a ser feito naquela condição do animal, muitas vezes a dor da perda pode ser atenuada, ainda que ligeiramente.
Em casos de confirmação de uma doença infecciosa, principalmente se houver outros animais na residência, é importante que o proprietário seja instruído a realizar a correta desinfecção do ambiente e dos objetos que pertenciam ao animal falecido, como camas, cobertores, tigelas, dentre outros. O proprietário também deve receber orientação apropriada para as formas de prevenção de determinadas doenças, como por vacinas, por exemplo, além de propiciar a realização de exames clínicos em seus outros animais visando constatar algum sinal de infecção. Em rebanhos, a morte de um animal por causa infecciosa muitas vezes pode significar um risco grave para toda a população de animais e também para a saúde pública. Caso a doença do animal tenha caráter zoonótico, ou seja, com potencial de transmissão para humanos, o proprietário também deve ser orientado a cuidar de sua saúde e realizar exames preventivos ou testes diagnósticos em postos adequados para atendimento médico humano.
A necropsia também pode apontar sinais de intoxicação, seja esta de caráter acidental ou intencional. A intoxicação acidental, como no caso da ingestão de produtos de limpeza, plantas tóxicas, medicamentos, iscas com raticidas, dentre outros, pode apontar um risco no ambiente em que o animal vivia, que deve ser corrigido antes que haja intoxicação de uma nova vítima, que pode ser tanto outro animal quanto uma criança, por exemplo. Por outro lado, a intoxicação intencional, como no caso do uso de substâncias conhecidamente tóxicas para provocar a morte de um animal, como chumbinho, raticidas, dentre outros, alerta para um ato criminoso, que deve ser registrado com boletim de ocorrência (B.O.) na delegacia, dentro da Lei 9605/98, que regula os crimes ambientais. Além disso, a intoxicação intencional também pode colocar em risco outros animais ou crianças que possam ter acesso às iscas contendo a substância tóxica².
A morte de animais recém-adquiridos em canis, gatis ou pet shops, dentre outros, também exige a realização da necropsia, visando à obtenção de informações suficientes e relevantes em relação à real causa de morte do animal. Conhecer a causa de morte de um animal recém-adquirido é importante tanto para a prevenção de doenças nos outros animais da casa e do local de origem ou comercialização, como também para fornecer subsídios para um possível acordo jurídico, se for o caso.
Há casos que apresentam suspeitas em relação aos procedimentos médico-cirúrgicos realizados no animal, como, por exemplo, nos casos de suspeita de erro médico que culmine com a morte do animal. Nesses casos, a realização da necropsia é fundamental para a avaliação da possível relação entre a atuação do profissional médico veterinário e a causa de morte do animal.
Por que fazer a necropsia: benefícios para o médico veterinário
Conforme mencionado anteriormente, em muitos casos a necropsia é o único exame capaz de determinar o diagnóstico definitivo daquele animal. O exame necroscópico também pode oferecer informações precisas sobre a extensão e a gravidade de uma condição patológica, como uma neoplasia em metástase ou um processo infeccioso disseminado, além de classificar e graduar possíveis neoplasias ou identificar determinados agentes etiológicos. A necropsia também permite a correlação entre os achados, como um processo infeccioso, neoplásico ou traumático, dentre outros, e o óbito em si. Além disso, são diversos os exames complementares que podem ser realizados após a morte. Dependendo do tempo ocorrido desde o óbito e das condições de conservação do cadáver, é possível realizar análises hematológicas e bioquímicas, urinálise, exames microbiológicos, técnicas moleculares, exames de imagem, investigação de substâncias tóxicas, dentre outros.
A realização da necropsia também é uma forma consistente de aprendizado contínuo para o profissional veterinário, não só em relação aos órgãos e sistemas, mas também aos processos patológicos e de resposta do organismo frente a determinados agentes etiológicos, tratamentos ou procedimentos clínico-cirúrgicos, por exemplo. Muitas vezes, a realização ou o simples acompanhamento do exame necroscópico pode auxiliar o veterinário na identificação de casos semelhantes no futuro, permitindo um diagnóstico rápido e preciso.
Em casos de suspeita de erro médico que resulte em óbito, como mencionado anteriormente, a realização da necropsia também é essencial para o médico veterinário envolvido no caso. Os achados de necropsia são fundamentais em casos de óbito de animais com potencial jurídico, podendo fornecer subsídios para a determinação ou refutação das suspeitas de negligência, imperícia ou imprudência³. Nesses casos, recomenda-se que a necropsia realizada seja documentada, ou seja, complementada com registros fotográficos de toda e qualquer alteração que o cadáver venha a apresentar. Suspeitas de maus-tratos ou abuso também apresentam potencial jurídico, indicando a necessidade da necropsia³.
Considerações finais
A necropsia é um exame essencial para a determinação da real causa de morte de um animal. Este exame oferece informações de grande relevância tanto para o proprietário quanto para o médico veterinário, sendo imprescindível em casos de óbito de animais com potencial jurídico.
Recomenda-se que a necropsia seja executada, sempre que possível, por um patologista veterinário. Estes profissionais têm grande experiência com as técnicas utilizadas para a realização de uma necropsia completa e eficiente, além de serem capazes de distinguir com precisão as lesões verdadeiras das alterações que ocorrem após a morte, propiciando uma correlação consistente entre os achados do exame e a causa de morte do animal.
Fernanda Auciello Salvagni: Médica Veterinária pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo em 2008. Atua principalmente nas áreas de Patologia Veterinária e Medicina Veterinária Legal, com ênfase em Patologia Forense. Doutoranda do programa de Patologia Experimental e Comparada da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo.
Referências bibliográficas
1. JENSEN, H.E. Necropsy. A Handbook and Atlas. 1st Ed., Biofolia, 2011.
2. DE SIQUEIRA, A.; CASSIANO, F.C.; LANDI, M.F.A.; MARLET, E.F; MAIORKA, P.C. Non-accidental injuries found in necropsies of domestic cats: a review of 191 cases. Journal of Feline Medicine and Surgery, v.14, n.10, p. 723-728. 2012.
3. SALVAGNI, F.A.; DE SIQUEIRA, A.; MARIA, A.C.B.E.; MESQUITA, L.P.; MAIORKA, P.C. Patologia veterinária forense: aplicação, aspectos técnicos e relevância em casos com potencial jurídico de óbito de animais. Revista Clínica Veterinária, n. 112, p. 58-72. 2014.
Fonte: Portal A Matilha