CRMV-AL, SOMVEAL E ACAMVET emitem nota conjunta contrária a cursos EaD para Medicina Veterinária
27 de maio de 2025 – Atualizado em 27/05/2025 – 3:28pm
NOTA CONJUNTA
CRMV/AL – SOMVEAL – ACAMVET
Maceió, 27 de maio de 2025
Assunto: Posicionamento Contrário à Inclusão do Curso de Medicina Veterinária na Modalidade de Educação a Distância (EaD)
O Conselho Regional de Medicina Veterinária de Alagoas (CRMV-AL), a Sociedade de Medicina Veterinária de Alagoas (SOMVEAL), e a Academia de Medicina Veterinária de Alagoas (ACAMVET), em consonância com o Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV) e diversas outras entidades de classe, vêm a público manifestar seus veementes e irrestritos posicionamentos contrários à recente decisão do Governo Federal, expressa na Portaria MEC nº 378/2025 e Decreto nº 12.456/2025, que reformula a Política de Educação a Distância (EaD) no país e, de forma surpreendente e preocupante, não inclui o curso de Medicina Veterinária entre aqueles que devem ser ofertados exclusivamente na modalidade presencial.
A Medicina Veterinária, por sua natureza intrínseca e complexidade, é uma ciência da saúde que exige uma formação acadêmica robusta, intensamente prática e presencial. A decisão de permitir a oferta de cursos de Medicina Veterinária na modalidade semipresencial ou a distância ignora completamente as particularidades e as demandas essenciais para a capacitação de profissionais aptos a atuar em áreas tão críticas para a sociedade brasileira.
A Essência da Formação em Medicina Veterinária: Prática e Vivência Real
É fundamental compreender que a Medicina Veterinária não é uma disciplina que pode ser aprendida predominantemente por meio de telas ou plataformas virtuais. Como bem ressaltado pela presidente do CFMV, Ana Elisa Almeida, em Posicionamento EAD para Medicina Veterinária:
“Medicina Veterinária é Medicina e a prática não se aprende por vídeo.”
Esta afirmação encapsula a verdade inegável de que a vivência prática é o pilar central da formação do médico veterinário. A profissão exige o desenvolvimento de habilidades manuais, sensibilidade clínica, capacidade de observação aguçada, raciocínio diagnóstico em tempo real e, acima de tudo, a interação direta e contínua com os animais, seus tutores e o ambiente.
A formação de um médico veterinário envolve uma série de competências que são adquiridas apenas em ambientes controlados e supervisionados, como clínicas, hospitais veterinários, laboratórios, fazendas, frigoríficos e centros de pesquisa. Dentre as habilidades insubstituíveis que a modalidade EaD não pode proporcionar adequadamente, destacam-se:
- Anatomia e Fisiologia Animal: O estudo aprofundado da estrutura e funcionamento dos organismos animais requer a manipulação de peças anatômicas, dissecções e a observação de processos fisiológicos em tempo real.
- Clínica Médica e Cirúrgica: O diagnóstico e tratamento de doenças, a realização de procedimentos cirúrgicos complexos, a interpretação de exames complementares e a tomada de decisões rápidas em situações de emergência são habilidades que demandam prática intensiva e supervisão direta de profissionais experientes. A palpação, ausculta, contenção de animais e a execução de técnicas invasivas são impossíveis de serem dominadas à distância.
- Patologia e Análises Laboratoriais: A coleta, processamento e análise de amostras biológicas, a identificação de agentes patogênicos e a interpretação de resultados laboratoriais exigem o manuseio de equipamentos específicos e a vivência em laboratórios.
- Saúde Pública e Defesa Agropecuária: A inspeção de produtos de origem animal, o controle de zoonoses, a vigilância sanitária e epidemiológica, e a atuação em programas de saúde animal e ambiental demandam visitas a campo, interação com comunidades e a compreensão de dinâmicas complexas que só a experiência presencial pode oferecer.
- Bem-Estar Animal: A avaliação do comportamento animal, a identificação de sinais de estresse ou dor, e a aplicação de princípios de bem-estar exigem observação direta e empatia, desenvolvidas através do contato constante com diferentes espécies e situações.
Os Malefícios para a Sociedade Civil Brasileira
A flexibilização da formação em Medicina Veterinária não compromete apenas a qualidade técnica dos futuros profissionais; ela representa um risco iminente e inaceitável para a saúde pública, o meio ambiente e a segurança alimentar de toda a população brasileira. A atuação do médico-veterinário é transversal e estratégica, impactando diretamente a vida de todos os cidadãos, mesmo que de forma indireta.
- Saúde Pública e Controle de Zoonoses: Médicos veterinários são a linha de frente no combate a doenças transmitidas de animais para humanos (zoonoses), como raiva, leptospirose, febre maculosa, leishmaniose, entre outras. Uma formação deficiente pode levar a diagnósticos errados, falhas na prevenção e controle de surtos, colocando em risco a saúde de milhões de pessoas.
- Segurança Alimentar: A inspeção de produtos de origem animal (carnes, leites, ovos, pescados) é uma atribuição exclusiva do médico-veterinário. Profissionais sem a devida capacitação prática podem comprometer a qualidade e a segurança dos alimentos que chegam à mesa do consumidor, resultando em intoxicações alimentares e outras doenças.
- Defesa Agropecuária e Economia: O Brasil é um gigante do agronegócio, e a sanidade dos rebanhos é crucial para a economia do país. Médicos veterinários atuam na prevenção e controle de doenças que afetam a produção animal, garantindo a saúde dos animais e a competitividade do setor. Uma formação inadequada pode levar a perdas econômicas significativas e à restrição de mercados internacionais.
- Bem-Estar Animal e Meio Ambiente: A proteção e o bem-estar dos animais, sejam eles de produção, companhia ou silvestres, são responsabilidades do médico veterinário. Além disso, a profissão desempenha um papel vital na conservação da fauna e flora, na gestão de ecossistemas e na mitigação de impactos ambientais. A falta de vivência prática compromete a capacidade de atuar nessas frentes.
O documento destaca a articulação do CFMV com o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), reforçando o papel estratégico da profissão nas políticas públicas ambientais, sanitárias e agropecuárias, especialmente no contexto da abordagem Saúde Única. Esta abordagem, que integra a saúde humana, animal e ambiental, é um conceito globalmente reconhecido e essencial para enfrentar os desafios de saúde do século XXI. A fragilização da formação veterinária impacta diretamente a efetividade dessa abordagem no Brasil.
A Posição das ENTIDADES e o Apelo ao Governo Federal
O CRMV-AL, a SOMVEAL, e a ACAMVET cientes de suas responsabilidades com a qualidade da formação profissional e com a proteção da sociedade, reitera seu apoio irrestrito às ações do Conselho Federal de Medicina Veterinária. É inadmissível que, enquanto cursos como Medicina, Direito, Odontologia, Enfermagem e Psicologia são reconhecidos como exclusivamente presenciais – por razões óbvias de necessidade prática –, a Medicina Veterinária seja excluída dessa lista, apesar de suas exigências formativas serem igualmente rigorosas e críticas para a saúde pública.
O Brasil já possui um número expressivo de cursos de Medicina Veterinária, ultrapassando 500 autorizações, o que nos coloca como líderes mundiais em número de graduações na área. No entanto, a quantidade não pode, em hipótese alguma, sobrepor-se à qualidade. A proliferação de cursos sem a infraestrutura e a metodologia adequadas, especialmente na modalidade EaD, é uma ameaça direta à excelência da profissão e à segurança da população.
Diante do exposto, fazemos um apelo urgente e veemente ao Ministério da Educação (MEC) e a todas as instâncias do Governo Federal para que reconsiderem a Portaria MEC nº 378/2025. Solicitamos que o curso de Medicina Veterinária seja imediatamente incluído entre as graduações que devem ser ofertadas exclusivamente na modalidade presencial, garantindo assim a formação plena e prática dos futuros profissionais e, consequentemente, a proteção da saúde pública, do bem-estar animal e do meio ambiente em nosso país.
O CRMV-AL, a SOMVEAL, e a ACAMVET permanecem à disposição para o diálogo e para colaborar na construção de soluções regulatórias que assegurem a qualidade da formação acadêmica e a proteção do interesse público, reafirmando nosso compromisso inabalável com a Medicina Veterinária e com a sociedade brasileira.
Conselho Regional de Medicina Veterinária de Alagoas (CRMV-AL)
Sociedade de Medicina Veterinária de Alagoas (SOMVEAL)
Academia de Medicina Veterinária de Alagoas (ACAMVET)