Zika, Dengue e Chikungunya – Uma preocupação constante
6 de outubro de 2017 – Atualizado em 06/10/2017 – 12:00am
A dengue, a febre chikungunya e a febre pelo vírus Zika são doenças de notificação compulsória e estão presentes na Lista Nacional de Notificação Compulsória de Doenças, Agravos e Eventos de Saúde Pública, sendo que a febre pelo vírus Zika foi acrescentada a essa lista apenas pela Portaria nº 204, de 17 de fevereiro de 2016, do Ministério da Saúde. (Brasil, 2017).
Essas doenças, consideradas arboviroses (doenças virais transmitidas por artrópodes), têm representado um grande desafio à saúde pública, devido ao dinamismo climático e ambiental, além de ações como os desmatamentos, o que favorece a amplificação, a transmissão viral, além da transposição da barreira entre espécies. (Lopes, 2014).
Aspectos como desigualdades éticas e de classe associadas a questões de saúde em geral e a doenças veiculadas por mosquitos em especial não são nem novas nem exclusivas do Brasil. Para que a febre amarela, por exemplo, fosse disseminada pelas Américas, um novo mosquito, o Aedes aegypti, teve de ser introduzido, ao que se supõe ter ocorrido na península de Yucatan, México, no ano de 1648 (Brasil, 1999). Estudos supõem que o mosquito foi trazido nas embarcações que transportavam escravos africanos para as Américas.
Esse mosquito encontrou condições bastante favoráveis nos centros urbanos em expansão nas Américas, desde o Brasil até os Estados Unidos. O Aedes aegypti é particularmente bem adaptado ao ambiente urbano, onde há grande concentração de pessoas e uma infinidade de locais servíveis à sua reprodução. Os mosquitos adultos adaptaram-se aos espaços residenciais e as larvas aquáticas encontraram um lar acolhedor nos recipientes artificiais para água encontrados em quase todas as casas, como caixas d‘água, baldes, pneus, garrafas, calhas de chuva, etc.
A ampliação da população e, consequentemente, o aumento da densidade nas cidades (apenas 20% da população brasileira vivia em cidades no ano de 1900, chegando 30% em 1940, 55% em 1970, e a mais de 80% em 2010 (Banco Mundial, 2011), contribuíram com a introdução de outros vírus que também são transmitidos por esse mosquito vetor. Há cerca de um século, chegaram a dengue e seus quatro sorotipos, e a partir de 2013, os vírus chikungunya e zika (2015) juntaram-se a eles nas Américas.
A dengue (termo derivado da frase suaíli Ki-Dengu pepo, que descreve os ataques causados por “espíritos do mal”, nesse idioma africano), é uma das arboviroses mais conhecidas pelo tempo em que vem sendo diagnosticada no Brasil (final do século XIX). Ela possui uma particularidade quanto à distribuição dos mosquitos, a frequência de suas picadas e o período de incubação do vírus, justamente por estes serem afetados pela temperatura, pluviosidade e velocidade do vento; por exemplo, em uma temperatura aproximada de 27°C, o período de incubação é de dez dias, no entanto, por volta dos 37°C esse período reduz-se para sete dias.
Além disso, a intermitência das chuvas no final da estação de verão e os ventos brandos colaboram com a proliferação e atuação do vetor (Mendonça, 2003; Mendonça, 2009).
O vírus chikungunya atingiu as Américas em 2013 e, no ano seguinte, mais de um milhão de casos foram notificados. No Brasil, foi registrada transmissão autóctone (originária no próprio local) no Amapá e Bahia, mesmo durante o período de baixo índice pluviométrico, expondo ao risco de propagação do vírus todo o território nacional. Historicamente, o Brasil é infestado por Aedes aegypti e Aedes albopictus.
O primeiro isolamento do vírus chikungunya (CHIKV) ocorreu em soro humano durante surto de doença febril na Tanzânia em 1953. A palavra chikungunya é derivada da língua Makonde (Kimakonde), um dos idiomas falados no sudeste da Tanzânia, e significa “curvar-se ou tornar-se contorcido”, referindo-se à postura adotada pelo paciente devido à dor articular grave nas infecções severas causadas pelo CHIKV (Lumsden, 1955; Robinson, 1955).
O zika vírus é identificado desde 1947, tendo sido originado da floresta Zika, em Uganda, país do leste africano. Por anos, espalhou-se por vários países do mundo até chegar ao Brasil, mais precisamente em abril de 2015, com início dos casos nos estados da Bahia e Rio Grande do Norte. No final do ano de 2015, haviam sido identificados casos nas cinco Regiões Geográficas do país e, o Ministério da Saúde estimou que, entre 500 mil e 1,5 milhão de pessoas haviam sido infectadas.
O vírus do zika teve impacto maior no Nordeste, nos estados de Bahia, Pernambuco e Rio Grande do Norte, onde uma percentagem maior da população é pobre e as condições climáticas são mais favoráveis à propagação de vírus transmitidos por mosquitos do que no Sul, região mais rica e com característica climática do tipo temperada.
No geral, os métodos de prevenção consistem em medidas de erradicação dos vetores e bloqueios de sítios de replicação, associados à vigilância dos casos suspeitos e confirmados, além de realizar triagem em casas, estimular o uso de repelentes e de mosquiteiros, como também pelo uso de agentes de dispersão química (carro fumacê, o qual utiliza o produto malathion – outra discussão).
Contudo, vale ressaltar que, em especial, mas não como um caso isolado e exclusivo, pode se considerar que as caixas d‘água sejam uma possível fonte de problemas. Embora muitas famílias tenham caixas relativamente modernas confeccionadas dos mais diversos materiais, outras ainda usam as caixas antigas, com tampas possivelmente avariadas, criando um local ideal para a reprodução dos mosquitos. Alguns erros de projeto na confecção de caixas d’água são possíveis e, por isso, podem criar problemas, pois caixas que utilizam bóia para interromper o fluxo de água quando estão cheias, estas podem, às vezes, não funcionar ocasionando o derramamento e consequente acúmulo em locais nem sempre de fácil acesso; além disso, existe um orifício por onde escoa a água excedente quando há problemas na boia de retenção e, este orifício, encontra-se permanentemente aberto, servindo de acesso para os vetores.
Esse orifício pode ser facilmente bloqueado quando a caixa está por debaixo do telhado da casa. Entretanto, naqueles imóveis que são ampliados verticalmente, as caixas acabam sendo alocadas no alto do telhado e não são facilmente acessíveis pelos agentes de endemias, caracterizando um falho processo de controle das doenças e erradicação dos vetores. (Malferrari, 2016).
Objetivando chamar atenção para o número de casos de arboviroses (dengue, zika e chikungunya) que vêm ocorrendo no Brasil e em Alagoas, segue abaixo um quadro com tais informações.
Quadro 1 – Quantitativo de casos de arboviroses (dengue, zika e chikungunya) no Brasil e em
Alagoas, 2016/2017.
Além dos casos mostrados na tabela anterior, também foram registradas mortes no ano de 2016 por chikungunya, tendo sido 196 óbitos no Brasil, dos quais 10 ocorreram no Estado de Alagoas.
No geral, as variações nos índices de infecção e registro de casos, ocorrem em função da proliferação dos locais de reprodução e das oportunidades de encontro entre mosquitos e seres humanos, que por sua vez dependem da densidade de pessoas e de insetos. Aspectos como qualidade das moradias, inexistência ou existência precária de redes de água e esgoto, temperatura (por exemplo, o efeito ilha de calor, decorrente, geralmente da estação do ano, além do crescimento urbano desordenado, edificações e elevado índice de pavimentação com asfalto), a exposição prévia ao vírus e outros fatores, muitas vezes favorecidos pela própria população, ajudam a determinar as taxas de transmissão e de infecção.
Diante disso, a Comissão Regional de Saúde Pública Veterinária do CRMV-AL, chama a atenção da população em geral para que fiquem atentos quanto às medidas de combate à proliferação de mosquitos, evitando o acúmulo de água parada em recipientes abertos, bem como a remoção de objetos em desuso e que estejam, eventualmente, acondicionados em ambiente exposto às chuvas; que revisem, periodicamente, a integridade das caixas d’água de suas casas, bem como, evitem manter um recipiente coletor da água de aparelhos de ar condicionado de forma permanente (esta pode ser drenada para um jardim, por exemplo).
Por fim, como forma de diminuir a agressão ao ambiente, aos animais e aos próprios humanos, priorize, sempre que possível o uso de raquetes elétricas para matar mosquitos, bem como telas nas janelas e portas de acesso ao interior da residência.
Referências
BRASIL – Boletim Epidemiológico Secretaria de Vigilância em Saúde − Ministério da Saúde. Volume 48 N° 5 – 2017.
BRASIL – Manual de vigilância epidemiológica da febre amarela – Brasília: Ministério da Saúde : Fundação Nacional de Saúde, 1999.
LOPES N.; NOZAWA C.; LINHARES R.E.C. Características gerais e epidemiologia dos arbovírus emergentes no Brasil. Rev Pan-Amaz Saude v.5 n.3 Ananindeua set. 2014.
LUMSDEN WHR. An epidemic of virus disease in Southern Province, Tanganyika Territory, in 1952-53. II. General description and epidemiology.Trans R Soc Trop Med Hyg. 1955;49(1):33-57.
MALFERRARI C. (Tradutor) O original em inglês – “The social geography of zika in Brazil” – encontra-se à disposição do leitor no IEA-USP para eventual consulta. Uma versão do artigo foi
publicada como “The social geography of zika in Brazil”, Nacla Report on the Americas, v.48, n.2, p.123-9, Summer, 2016.
MENDONÇA, F. Aquecimento global e saúde: uma perspectiva geográfica — notas introdutórias. Revista Terra Livre, São Paulo, nº 20, p. 205-221, 2003.
MENDONÇA F.A.; VEIGA e SOUZA A.; DUTRA D.A. Saúde pública, urbanização e dengue no Brasil. Soc. nat. (Online) vol.21 no.3 Uberlândia Dec. 2009.
ROBINSON MC. An epidemic of virus disease in Southern Province, Tanganyika Territory, in 1952-53. I. Clinical features. Trans R Soc Trop Med Hyg. 1955;49(1):28-32.
1 Presidente da Comissão Regional de Saúde Pública Veterinária do CRMV-AL.
² Membros da Comissão Regional de Saúde Pública Veterinária do CRMV-AL.
³ Médico Veterinário Autônomo.